Brasília – Na disputa pela sucessão na presidência da Câmara dos Deputados, um nome tem despontado como o de possível “consenso” entre o governo federal e o atual chefe da Casa, Arthur Lira (PP-AL): o deputado federal Marcos Pereira.
Presidente do Republicanos, o parlamentar reeleito por São Paulo ainda não tem o apoio formal de petistas e de Lira para comandar a Câmara a partir de fevereiro de 2025. Sua pré-candidatura, porém, tem sido trabalhada a toda carga nos bastidores do Congresso.
Marcos Pereira, 52 anos, advogado, professor de Direito e bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, adota uma postura liberal quando o assunto é a pauta econômica. Com um ministro de sua legenda dentro do governo Lula (Silvio Costa Filho, à frente da pasta de Portos e Aeroportos), Marcos Pereira mantém o Republicanos com um pé em cada canoa.
Se, por um lado, mantém relações estreitas com artífices de Jair Bolsonaro, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que é de seu partido, troca afagos com a base do governo petista e não poupa elogios ao trabalho de ministros como o da Fazenda, Fernando Haddad.
Ainda assim, Pereira acredita que a “ala ideológica” do PT imprime uma postura mais estatizante. “Eu vejo que o Haddad tem boa vontade e que tenta conduzir os temas econômicos dessa forma. Ele entendeu que a pauta sobre o aumento e a distribuição de renda, que é um tema importante para eles, passa necessariamente pelo crescimento econômico, mas às vezes ele fica engessado pela questão ideológica do partido.”
Nesta entrevista, o NeoFeed apresenta o que o pré-candidato à presidência da Câmara Marcos Pereira pensa sobre o cenário econômico, o desempenho do governo nesta área, as prioridades atuais e as futuras reformas que pretende fazer, caso seja eleito pela maioria dos 513 membros da Casa.
Nas próximas semanas, o NeoFeed trará reportagens com bastidores e entrevistas com os demais pré-candidatos à vaga, para revelar o que cada um pensa sobre a agenda econômica nacional. Afinal, os principais projetos do país passam pela Câmara e o seu presidente tem um papel fundamental no avanço – ou retrocesso – do Brasil. Acompanhe:
Qual a avaliação do senhor sobre a forma com que o governo Lula tem conduzido a pauta econômica?
De maneira geral, acho que a pauta econômica está indo bem, mas sempre pode melhorar. Acho que o [ministro da Fazenda, Fernando] Haddad acerta bastante, mas ele tem algumas dificuldades, dentro do próprio governo e do partido, por exemplo, quando se fala do controle dos gastos públicos. Há um entorno do governo e da legenda, que sempre quer gastar um pouco mais. Na média, acho que está indo bem. Já fiz elogios para ele (Haddad) em outras ocasiões e oportunidades. Eu acredito que, talvez, seja o momento de focar um pouco mais no controle de gastos e menos na arrecadação, porque, para arrecadar mais, tem que aumentar a carga e isso nunca é bom. Apesar de algumas dificuldades, eu avalio que está indo bem.
O governo enviou ao Congresso a revisão da meta fiscal, com redução do que previa para o próximo ano. No lugar de um superávit de 0,5%, o texto fixa a meta em déficit zero. Qual a leitura do senhor sobre esse cenário?
O ideal é que se tivesse mantido a programação original. Essa coisa de fazer déficit zero, em vez de se fazer o crescimento programado, não é o ideal. Mas, infelizmente, o mundo ideal nem sempre é o real. Então, que nos pautemos pelo equilíbrio.
Como o senhor avalia a mudança de postura e perfil entre o ex-ministro Paulo Guedes e Fernando Haddad?
Eu acho que são duas políticas econômicas completamente diferentes. A política econômica do Guedes era uma política de privatização, de estado mínimo, de redução de custos e de reformas estruturantes, como foi a da Previdência, como a Reforma Administrativa, que eles encaminharam para cá. Esse texto está parado e não sei se vai ser apreciado ou não. Isso depende muito do diálogo da Casa com o governo e com o presidente da Casa. Mas, voltando aos ministros, eu acho que se trata de abordagens completamente diferentes.
“O Estado tem que ser indutor, não o impulsionador do crescimento econômico”
De que forma?
A política econômica do Guedes estava um pouco mais próxima daquilo que eu acredito, na busca de um Estado menor. Claro que não se trata de um Estado mínimo, tem que tomar cuidado com isso, mas acho que deve ser buscado um tamanho ideal, uma política mais liberal na economia, com menor intervenção do Estado. Eu acho que o Estado tem que ser indutor, não o impulsionador do crescimento econômico.
Como o senhor avalia a postura do governo em relação a empresas públicas como a Petrobras e o Banco do Brasil? O senhor acha que o governo é intervencionista?
Sob meu ponto de vista, penso que é preciso ter um pouco mais de cuidado quando se fala de Petrobras, de Banco do Brasil e de outras empresas públicas que são listadas em bolsa. A condução teria de ser a mais próxima do mercado e do profissionalismo possível, menos politizada. Veja as riquezas que essas empresas geram, o número de empregos. Quanto menos influência política houver nestas empresas, melhor. Eu vejo que o Haddad tem boa vontade e que tenta conduzir os temas econômicos dessa forma. Ele entendeu que a pauta sobre o aumento e a distribuição de renda, que é um tema importante para eles, passa necessariamente pelo crescimento econômico, mas às vezes ele fica engessado pela questão ideológica do partido.
As emendas de relator são defendidas no parlamento como necessárias para se chegar às bases eleitorais, mas são extremamente criticadas pela falta de transparência e a forma como são viabilizadas. O que o senhor pensa sobre o assunto?
As emendas, infelizmente, são muito mal compreendidas. Há um olhar pejorativo sobre as emendas. Criaram a pecha de orçamento secreto, mas a verdade é que não existe orçamento secreto.
O problema é que parlamentares podem destinar recursos que saem diretamente dos cofres da União, sem muita clareza sobre o destino desse dinheiro…
Posso falar por mim e a maioria dos meus colegas. Eu divulgo, no meu site, todas as cidades e quanto que foi designado para cada uma, 100% das emendas impositivas e das minhas extras, que chamam de secreta ou de relator. Eu tenho interesse que a população saiba o que você está levando e proporcionando aquela melhoria. Isso é divulgado, também, no site do prefeito, do vereador, que é do seu parceiro local, e nos portais e blogs locais. Isso é política pública. Quem conhece melhor o Estado? Eu, que rodei 500 dos 645 municípios do Estado de São Paulo, ou o ministro? Então, quando você tem 513 parlamentares aqui, mas 81 Senado, que têm essa prerrogativa de distribuir recursos, eu vejo uma política pública onde o beneficiário final é a população. Quem é que sabe de uma cidade como Sud Mennucci, que estou indo visitar? Quem é que sabe da dificuldade de Buritizal? Eu, que já visitei duas vezes. O ministro, independentemente da pasta, não sabe que existe uma cidade chamada Buritizal, um município de 5 mil habitantes no interior de São Paulo. Então, eu acho que a gente precisa desmistificar essa questão das emendas.
Em 2022, o STF decidiu que essa modalidade de liberação é inconstitucional, por falta de transparência.
Sim. Novas regras foram aprovadas. Eu entendo que, quanto mais houver transparência, melhor. Não tenho problema nenhum em dizer que eu enviei uma emenda para algum local e para o que foi. No meu mandato passado, eu liberei pouco mais de R$ 500 milhões em quatro anos. É interesse do parlamentar que se divulgue, para a população saber. E, como disse, o parlamentar conhece melhor a necessidade do município do que os burocratas de Brasília, não tenho dúvida disso.
“É preciso ter um pouco mais de cuidado quando se fala de Petrobras, de Banco do Brasil e de outras empresas públicas que são listadas em bolsa. A condução teria de ser a mais próxima do mercado”
Como o senhor avalia o cenário atual na área de infraestrutura, que é um dos principais setores para impulsionar emprego e fazer a economia girar? É a favor das concessões?
Eu acho que, no governo anterior, havia uma disposição maior para fazer concessão e repassar à iniciativa privada a execução de serviços que são exclusivos, hoje, do setor público, mas esse tem dado continuidade, como vemos com o ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, que é do meu partido. Algumas coisas continuarão, mas é óbvio que o ritmo e a disposição são menores.
Qual é a sua visão sobre a modalidade?
Na minha opinião, quanto mais serviços essenciais estiverem na mão do setor privado, o resultado só vai melhorar. Tirando as áreas de saúde, educação e segurança, tudo deveria ser concedido. Veja o que era o aeroporto de Guarulhos, o que era e como está hoje. Olha como ficou o aeroporto de Brasília, de Florianópolis. Essa é a minha posição, por princípio partidário. O liberalismo econômico está no manifesto político do meu partido.
Estamos no início do processo de regulamentação da reforma tributária, vital para o cenário econômico. É um caminho longo. De repente, parte das decisões ficará para a próxima presidência da Câmara. Qual a avaliação do senhor sobre a condução do tema aqui na Câmara e pelo governo?
Eu sou apegado aos meus princípios e aos meus valores, sem, obviamente, ser radical e intransigente. Como disse, o mundo ideal nem sempre é o mundo real. Temos que tentar aproximar o máximo possível o ideal do real. A emenda constitucional da reforma tributária, a meu ver, não foi a ideal, mas foi o que o mundo real permitiu construir.
E qual seria a sua avaliação sobre ela?
Não tenho dúvida de que é um grande avanço para o Brasil. Eu sempre disse, desde que fui ministro de Indústria e Comércio Exterior do governo do Michel Temer, que a reforma tributária era a mãe de todas as reformas. Eu falava de reforma administrativa, reforma tributária, reforma trabalhista, reforma previdenciária e reforma política. São cinco reformas, sendo que, de todas essas, a mais importante, a meu ver, sempre foi a tributária, que mexe na veia do crescimento econômico, da facilitação do ambiente de negócio, da desburocratização. Então, em primeiro lugar, acho que já foi um grande avanço. Faço uma crítica, porém, sobre o prazo de transição, que é muito longo, mas foi o meio possível para se chegar a um acordo. Agora, é o momento de construir esse caminho a quatro mãos, entre governo e parlamento.
Tem sido?
Vamos ver a partir de agora. Foi combinado que o Ministério da Fazenda faria a proposta e traria, como rege a nossa Constituição e a democracia. A palavra final sempre será do parlamento, principalmente no sistema constitucional que nós temos. Se é uma PEC, é o parlamento que aprova e que promulga. O presidente [da República] não tem nem interferência. Há política no debate, discussão e articulação, mas a decisão de promulgar PEC é do Congresso. Claro que, agora, haverá muita discussão, novamente. São muitos interesses para cá, para lá, e a gente vai chegar no mundo possível.
“Precisamos aprovar uma reforma administrativa. Eu acho que a gente precisa, e o governo deve estimular isso, em um diálogo constante com essa Casa”
Para além do que já está colocado, qual é a pauta econômica que, no entendimento do senhor, é urgente e deve ser tocada pela Câmara?
Precisamos aprovar uma reforma administrativa. Eu acho que a gente precisa, e o governo deve estimular isso, em um diálogo constante com essa Casa, para se debruçar neste tema. É uma pauta complexa, que deve levar um ano, um ano e meio, mas que precisa avançar.
Um tema que hoje está um pouco escanteado no Congresso…
Existe uma reforma que foi mandada pelo governo anterior, mas que está parada. O presidente Arthur Lira chegou a falar que iria tocar, que iria dialogar com o governo.
Se assumir a presidência da Câmara, o senhor daria atenção maior a esse assunto, é isso?
Daria uma atenção especial a essa pauta e me empenharia nisso, dialogando com o governo, para tentar aprovar alguma uma proposta que reformule a estrutura do Estado.
“A gente deveria ter menos ministérios do que temos hoje. Você passa uma imagem melhor”
O governo anterior reduziu o número de ministérios, mas isso não é apenas colocar várias pastas debaixo de um único nome? Não é trocar seis por meia dúzia?
Sendo muito franco, eu sou da opinião que a gente deveria ter menos ministérios do que temos hoje. Você passa uma imagem melhor. Eu respeito a decisão atual, porque acho que quem ganhou uma eleição tem o direito de tentar implantar seu plano de governo, sua proposta. Mas, veja. Quando o governo cria o Ministério dos Povos Originários, nós sabemos que toda a estrutura dele, na verdade, já existia dentro de outras pastas. Vi isso quando fui ministro no governo Temer. Recebi a Secretaria de Micro e Pequenas Empresas dentro do MDIC, uma área que hoje voltou a ser ministério. Então, toda aquela estrutura que era ministério retirou dois cargos, o do ministro e o do secretário executivo. O resto todo continuou. A estrutura, basicamente, é a mesma.
Como seria uma reforma administrativa?
O que uma reforma traria é um planejamento, um estudo da máquina federal para verificar se a estrutura está inchada e o que deve ser feito. O Estado deveria ser administrado como uma empresa, com pragmatismo, resultado, eficiência, mas sem, obviamente, deixar a característica do que é inerente ao poder público. A conta da saúde, segurança e educação não fecha nunca, e quanto mais o governo puder investir nessas áreas, melhor.
Qual nota o senhor daria para a condução da economia pelo governo? Qual a sua avaliação?
Eu sou professor de Direito, já lecionei durante alguns anos. Eu prefiro não dar nota, porque sou muito exigente na minha avaliação.
Isso significa uma reprovação?
Eu acho que, na política econômica, o governo passaria. Mas, olha, seria ali no limite do mínimo necessário para passar. Como eu sou muito mais liberal e exigente na avaliação, eu acho que o governo passa, mas passa ali, raspando.