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Restaurante de SP recebe até 250 clientes por dia com pratos à base de arroz e músicas tocadas no vinil

Fonte: Redação

O perfume que exala das panelas se mistura ao som dos vinis tocados na vitrola do Conceição Discos & Comes, no bairro Santa Cecília, no Centro de São Paulo. Tudo é sentido por quem chega ao restaurante idealizado há mais de dez anos pela chef Talitha Barros, que coleciona passagens em grandes cozinhas profissionais ao longo de 25 anos de carreira.

Com a proposta de ser uma cozinha afetiva e artesanal, a casa tem como carro-chefe os pratos à base de arroz, que representam 20% do faturamento do negócio — a empreendedora não revela o montante. Inaugurado em março de 2014, o restaurante aumentou de tamanho nos últimos dez anos e passou de 26 para 62 lugares. Atualmente, recebe de 180 a 250 clientes por dia.

De acordo com ela, o Conceição Discos & Comes nasceu do desejo de aplicar os conhecimentos adquiridos ao longo da carreira em sua própria cozinha, além de experimentar novas possibilidades dentro da gastronomia. Com um investimento inicial de R$ 300 mil, a chef começou o negócio com equipamentos de cozinha de segunda mão e até alguns mobiliários da própria casa. O restaurante também tem forte relação com as memórias da sua infância com o avô e dos mutirões para o preparo de pamonha em família.

“Sou nascida e criada em São Paulo e sempre tive uma infância, uma adolescência e, logicamente, uma vida adulta muito urbana. Só que eu tenho a sorte de ser neta de um indígena que, em um determinado momento da vida, resolveu voltar às origens, em um ambiente onde ele se sentia mais à vontade, na divisa do Goiás com Tocantins, à beira do rio Araguaia. Então, eu passava as minhas férias com ele e [vivia] esse universo de pesca, de proximidade com a natureza. Isso sempre me encantou”, conta.

Antes de transformar a cozinha em profissão, Barros pensava em seguir o caminho da antropologia, por meio de uma graduação de Ciências Sociais, na Universidade de São Paulo (USP). “A ideia era ocupar algum cargo público ou fazer algo que pudesse preservar os saberes culturais dos povos originários brasileiros”, conta.

No entanto, durante uma greve na faculdade, ela conseguiu uma vaga de emprego como ajudante de sushiman, e as panelas entraram na sua trajetória profissional. “Me apaixonei pela cozinha.” Após se formar na primeira faculdade, ela se rendeu à paixão e deu início ao curso de Gastronomia.

Chef se inspira em memórias de pescaria com avô à beira do Rio Araguaia — Foto: Reprodução / Instagram
Chef se inspira em memórias de pescaria com avô à beira do Rio Araguaia — Foto: Reprodução / Instagram

A cozinha do Conceição Discos & Comes transmite toda essa paixão aos clientes. A experiência já começa pela visão da cozinha aberta e separada apenas pelo longo balcão lilás e verde. No espaço, a chef trabalha enquanto acena e bate um papo com a clientela que se acomoda no outro lado do balcão.

“Queria cozinhar na frente das pessoas, ter um lugar de coisas analógicas em São Paulo, um disco na vitrola, um cheirinho de comida no ar. Aquela sensação de uma grande conversa na cozinha”, diz.

Com lenços e turbantes de cores vibrantes, a chef chama atenção pela maneira ágil e leve com que mexe as frigideiras e estala os ovos — item indispensável que acompanha pratos como arroz de camarão e arroz de pato, que custam entre R$ 41 e R$ 52.

Quanto ao cardápio ser à base de arroz, Barros destaca que a escolha partiu do desafio de pensar em algo original e que fizesse sentido para a “colcha de retalhos” presente na cultura de São Paulo.

“Tem alguns estados brasileiros que têm a cultura muito cristalina e muito fácil de acessar. A paulistana é uma colcha de retalhos, tem um híbrido de várias culturas. Eu decidi pegar o nosso comportamento paulistano, porque paulistano é quem está lá fazendo a cidade, nascido ou não. A cidade é feita por quem está ali, trabalhando, vivendo e consumindo”

De acordo com a chef, o arroz possibilita a entrega de uma refeição completa por meio de diversas combinações com carnes, especiarias, peixes, frutos do mar, vegetais e legumes. O cardápio oferece opções de arroz variadas do dia, entradas, petiscos, sobremesas, bebidas e cervejas artesanais.

“Lanche é lanche, comida é comida, e é um traço muito forte da nossa cultura. Então, pensei, poxa, por meio do arroz, eu consigo entregar uma refeição completa, passear por sabores brasileiros e falar das nossas práticas culinárias, como a ‘refoguinha’, a carne ‘pregadinha’ na assadeira”, reitera.

Pratos à base de arroz são marca registrada do restaurante — Foto: Reprodução / Instagram
Pratos à base de arroz são marca registrada do restaurante — Foto: Reprodução / Instagram

A cultura do negócio também é marcada pela música que pode ser apreciada na vitrola. Com uma seleção de discos dignos de colecionador, o repertório vai de Michael Jackson a Luiz Melodia. Vale destacar que a trilha é escolhida de forma criteriosa pela equipe e pensada conforme o movimento do restaurante. Quanto mais cheio, a pedida é por discos mais dançantes e animados. Também é comum e esperado que alguns clientes façam pedidos musicais e comprem os discos, que são vendidos no local.

“Para a minha sorte, eu sou de uma geração que sempre teve disco, comecei a ouvir música com vinil. Quando elaborei a trilha da casa, pensei também em saborear a música, que acho que só os discos de vinil possibilitam”, destaca, ao se declarar fã de Tim Maia e The Beatles.

Equipe 100% feminina

Uma das características do Conceição Discos & Comes é que apenas mulheres trabalham no local, totalizando 15 profissionais. Com menção ao sagrado feminino — movimento de conexão e empoderamento das mulheres –, a chef explica que um dos objetivos é contribuir para que outras profissionais tenham autonomia e independência financeira por meio do trabalho, além de remar contra o machismo na cozinha profissional.

“A cozinha profissional tem uma cultura muito agressiva e machista. Por muitos anos, eu ouvi que não tinha vaga para mim porque eu era mulher. Trabalhei mais para provar que eu merecia ser respeitada. Quando eu abri o meu restaurante, o grande sonho era que fôssemos apenas mulheres. Também são todas vindas do mesmo lugar que eu, que é a periferia da Zona Sul de São Paulo”, afirma.

Como propósito do restaurante, a chef ainda realiza uma curadoria atenta e criteriosa na escolha dos fornecedores. Ela busca produtos agroecológicos e orgânicos em todo o Brasil, a exemplo do arroz produzido em assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Em 2024, por conta da tragédia no Rio Grande do Sul, Barros passou a priorizar ainda mais as cooperativas da região para a compra de insumos.

“Eu sou muito categórica e carinhosa com todos eles. Os ovos são orgânicos, eu conheço o produtor das ervas, dos vinhos e até das cervejas. (…) São pessoas que me deram a oportunidade de conhecer as fazendas, aprender sobre isso, porque a gente tem que ter muita intimidade com o alimento para saber prepará-los da melhor forma.”

Com o olhar para o futuro, a chef projeta o crescimento do faturamento no próximo ano para continuar investindo em melhorias para o restaurante, como a substituição de ventiladores por ar-condicionados. Além disso, Barros revela, sem dar muitos detalhes, que tem nutrido ideias para a criação de um novo negócio.

“Eu quero muito fazer umas melhorias, e o restaurante também envelhece. Temos que lembrar disso porque as empresas envelhecem. Eu acho que é a hora de investir em alguns maquinários legais e estou sonhando com isso. Então, espero que tenhamos um aumento de 30% a 40% no faturamento para dar esse gás no próximo verão”, conta.

*Participante do Curso Valor de Jornalismo Econômico, sob supervisão de Paulo Gratão.

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