Com dívidas que somam cerca de R$ 130 milhões com shopping centers e bancos, a Polishop, de João Appolinário entrou com uma medida cautelar de tutela preparatória para um pedido de reestruturação extrajudicial na última sexta-feira (5/4). O plano de reestruturação da marca, iniciado neste mês, envolve a abertura de franquias da empresa. PEGN conversou com o empresário sobre a iniciativa e consultou especialistas que alertam para riscos de abastecimento, credibilidade e modelo de negócio.
Para Appolinário, a crise atual é o resultado de uma combinação de fatores nos últimos anos, que envolvem “a elevação da Selic [a taxa básica de juros chegou a 13,75% em 2022; atualmente, está em 10,75%] , a restrição ao crédito para o varejo, o endividamento das famílias, o aumento do custo de ocupação dos shoppings, regulado pelo IGP-M, e os dissídios salariais, regulados pelo INPC, entre 2019 e 2022”.
As respostas para a situação foram o fechamento de lojas em shopping centers — reduzindo de cerca de 280, em 2019, para pouco mais de 70 atualmente —, o pedido da medida cautelar e o lançamento de franquias. O plano é abrir 23 unidades em 2024, chegar a 102 lojas em 2025 e alcançar 314até o final de 2028.
Em entrevista a PEGN, o fundador da Polishop diz que o plano de franquias da Polishop existe desde 2017 e entraria em vigor em 2020, mas foi interrompido pela pandemia. “Em 2016, chegamos a testar lojas de rua, com todos os desafios que envolvem o modelo. Vimos como é difícil operar como loja própria”, diz.
De acordo com ele, a “demora” se deu pela dificuldade de levar o conceito omnichannel da marca para as franquias nas últimas décadas. A Polishop nasceu na segunda metade dos anos 1990 com vendas pela televisão, que eram intermediadas por meio de um call center. Em 2003, abriu as primeiras lojas físicas, mas com ainda bastante peso das vendas “digitais”. “Eu tinha que comprovar que os canais se complementavam e não competiam. Hoje, isso é mais aceito e compreendido por todos”, afirma.
O que é uma recuperação extrajudicial?
A medida cautelar solicitada pela Polishop dura 30 dias. Depois, a marca deve migrar para o status de recuperação extrajudicial. Diferentemente da recuperação judicial, que envolve trâmites jurídicos, a recuperação extrajudicial é um acordo feito entre a empresa em crise e seus credores. Outras varejistas, como a Amaro, já recorreram ao recurso.
“Acontece em um âmbito privado. Geralmente a empresa faz um acordo parecido com o que é feito na recuperação judicial, mas mais simples, com menos burocracias”, explica Thais Kurita, advogada especializada em franquias e varejo, sócia da Novoa Prado Advogados.
Alberto Goldenstein, advogado do GMP&GC Advogados Associados, diz que a recuperação tem como principais vantagens a possibilidade de crédito recorrente, a renegociação das dívidas, a manutenção de fonte pagadora e o enfrentamento do momento delicado para superar as dificuldades.
Com o pedido da Polishop e o entendimento do juízo de São Paulo, as cobranças e processos dos credores estão suspensos. “Isso dá um prazo para que a empresa apresente seu pedido de recuperação, seja judicial ou extrajudicial”, explica o especialista.
Quanto custa uma franquia da Polishop?
O investimento para ter uma franquia da Polishop parte de R$ 250 mil, sendo R$ 90 mil de taxa de franquia e R$ 80 mil de capital de giro. Os royalties serão cobrados sobre a compra dos produtos, e o retorno é estimado em até 18 meses. De acordo com Appolinário, a primeira unidade deve ser aberta até o fim do próximo mês, na zona Sul de São Paulo.
Franquias vão operar com estoque reduzido
As unidades franqueadas vão comercializar todos os produtos da ICHEF, marca própria da Polishop, que inclui airfryers, panelas e liquidificadores, itens de beleza da Be Emotion e a linha fitness da Genis.
O foco de expansão está centrado, inicialmente, no estado de São Paulo. Para resguardar os franqueados, a rede pretende manter franquias perto de lojas próprias, para que o franqueado tenha um estoque reduzido, liberando o capital de giro. “Ele não precisa ter mais produtos de fitness e casa do que os de mostruário, por exemplo. O cliente compra e recebe na casa dele diretamente da loja própria, que faz o last-mile”, afirma Appolinário.
Posteriormente, a marca deve seguir para outros estados da região Sudeste e Sul, mas sempre mantendo uma distância de até 90 minutos de uma loja própria. O empresário afirma que também está “reabrindo” unidade, com negociações “mais vantajosas” com shopping centers. “Em muitos casos, é preciso fechar para reabrir com condições melhores”, diz.
Há riscos em abrir uma franquia da Polishop neste momento?
A credibilidade é o ponto mais sensível de uma expansão de franquias durante uma crise, de acordo com Thais Kurita, da Novoa Prado. “A primeira barreira é convencer seu futuro parceiro de que vai ficar tudo bem, de que a recuperação extrajudicial não vai evoluir para uma recuperação judicial. Mesmo que seja um recurso para que a empresa se recupere, e muitas se recuperam, é um flerte com a falência”, diz.
Kurita ainda diz que é preciso deixar claro para o franqueado como se dará o abastecimento das lojas, e que ele não será prejudicado em uma eventual recuperação judicial. “Na Circular de Oferta de Franquia (COF), há um campo para informações sobre processos em andamento. A franqueadora não é obrigada por lei a inserir, mas o empreendedor pode perguntar e até levar para a análise de um advogado”, sugere.
A especialista ressalta que “economicamente, o projeto da Polishop é viável” e que a decisão pode ser favorável, mas alerta que “adotar o sistema de franquias como um ‘bote salva-vidas’ é um pouco arriscado”. Na prática, a empresa vai trasferir custos das lojas próprias, que têm o desafio de operar com um regime tributário mais oneroso, para as franquias, que na maior parte dos casos, funcionam no Simples Nacional.
Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) lembra que uma das razões para uma empresa franquear é crescer com capital de terceiros, o que pode fazer sentido para a Polishop neste momento. Na visão de Terra, o modelo de negócio da empresa, que opera com um tíquete médio mais elevado, não é um impeditivo para o sucesso da franquia.
A decisão de levar para galerias e pontos de rua também pode ser interessante, uma vez que a empresa foge dos valores de ocupação em shopping center. “Mas o empreendedor interessado deve analisar se o formato franqueado tem comprovação de sucesso. É preciso entender se houve uma revisão do modelo de negócio, analisando indicadores como venda média por loja e margens. A marca é forte, tem um fundador sério, uma história interessante”, diz.
Appolinário admite que as unidades franqueadas não devem ser relevantes no plano de recuperação neste ano, mas aposta que o modelo de operação das franquias, no Simples Nacional, trará uma margem de lucro maior para as lojas. “Nosso problema não está na demanda, nosso e-commerce cresceu na pandemia. Está nas despesas”, diz.
Empresário tem investido em franquias nos últimos anos
Já faz alguns anos que Appolinário vem empreendendo no setor de franquias. Por meio da sua holding, a JAAP Franchising, o empresário está envolvido com a Mega Studio Be Emotion, adquirida em 2020, com 20 unidades em funcionamento; a WiseHome, que é uma rede de lojas de automação residencial com 86 unidades; e a marca de tintas Decor Colors, que dobrou de tamanho no ano passado. O próprio Appolinário se tornou um franqueado da rede de brechós Peça Rara em 2022.