As casas que receberam os barrageiros que participaram da construção da usina de Itaipu, em 1975, hoje abrigam um parque tecnológico que integra centro de pesquisa, universidade e startups. Denominada Itaipu Parquetec, a iniciativa foi criada em 2005 pela Itaipu Binacional – hoje parque e usina possuem CNPJs distintos. O ecossistema de inovação, localizado em Foz do Iguaçu (PR), conta com três universidades, 48 laboratórios de pesquisa e 74 startups.
Como uma iniciativa da Itaipu Binacional, o parque tecnológico nasceu para solucionar questões relacionadas à usina. “Nós temos uma relação conceitualmente conflituosa. A Itaipu, às vezes, pede determinadas atividades que não estão no escopo do nosso interesse. Algumas não trazem resultado, enquanto outras dessas atuações trazem legado para nós”, revela Irineu Mario Colombo, diretor-superintendente da Itaipu Parquetec.
Dentro do parque, por exemplo, nasceu o Centro de Segurança de Barragem, para realizar monitoramentos da usina. “A tecnologia faz simulação digital de eventos críticos relacionados à diminuição do nível da água ou à possibilidade de terremoto”, diz Colombo. A tecnologia desenvolvida pelo parque gerou um contrato com o Porto de Santos, em São Paulo, e com barragens de mineração.
Outro exemplo é a startup 3DI Engenharia, que nasceu dentro da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), integrada ao parque. Dentro do ecossistema, Lucio Ricken e Maycon Savoldi tiveram a oportunidade de se conectar com o Centro Internacional de Energias Renováveis (CIBiogás) e criar um filtro para os biodigestores de Itaipu – que transforma metano (rico em dióxido de carbono) em biometano (gás purificado que pode ser usado como energia). “Hoje, a 3DI é uma empresa que exporta os filtros de biogás para o mundo inteiro”, completa o diretor.
Quando surgiu, a Itaipu Binacional era responsável por 98% da receita do parque. Porém, Colombo explica que essa lógica está se invertendo desde 2023. A mudança de nome marca essa transição – antes chamado de Parque Tecnológico Itaipu, o espaço ganhou a nomenclatura de Itaipu Parquetec. “Estamos indo para o mundo dos negócios, fazendo uma gestão mais empresarial. Antes se assemelhava a uma administração pública.” A nova gestão, segundo o diretor, proporciona maior agilidade, com uma administração mais voltada para o lucro e com mais investimentos vindos de fora. “Temos 800 funcionários e uma cultura focada em metas”, revela.
O investimento vindo da Itaipu está garantido até 2026. Para os próximos anos, o orçamento ainda é incerto devido à negociação do Anexo C, que envolve possível mudança de preço da energia e soberania do Paraguai. “Precisamos de subsídio privado ou público. Em nenhum lugar do mundo existe parque tecnológico autossuficiente”, reforça Colombo. O desafio de manutenção também é vivido por outros ecossitemas, como aponta dados divulgados durante a 35ª Conferência Anprotec: 70% dos parques relataram escassez de recursos financeiros.
Inovação atrelada à sustentabilidade
A maior parte das startups que integram o parque possui soluções ligadas ao meio ambiente – em 2024, elas compunham 27% das empresas de inovação do Itaipu Parquetec. Para Colombo, a integração com a usina é o que leva a esse percentual maior. “A usina tem uma compensação histórica, o lago precisa ser preservado. É uma necessidade econômica. Se o lago assorear, por exemplo, há menos potência no funcionamento da hidrelétrica”, analisa.
É o parque tecnológico, por exemplo, quem produz os relatórios de ESG e faz o monitoramento da flora e fauna da Itaipu Binacional. Com ações voltadas à sustentabilidade, o parque garante sua participação durante a COP30, com a apresentação de um barco 100% movido a hidrogênio. “No caso do barco, o único resíduo gerado é água pura, que retorna diretamente para o rio ou para o lago”, diz Daniel Cantane, gerente do Centro de Tecnologia de Hidrogênio.

O Centro de Tecnologia de Hidrogênio surgiu transformando o excedente de água da usina em hidrogênio verde, fonte de energia limpa que emite apenas vapor d’água durante o seu uso. No barco desenvolvido, uma célula a combustível transforma a energia química do hidrogênio em energia elétrica – possibilitando o movimento do motor do barco. “Também foi adicionada uma fonte de energia solar no teto para auxiliar na propulsão”, explica Cantane. O barco será inaugurado durante a COP30 e depois seguirá para a Amazônia fazendo a coleta de resíduos sólidos urbanos.
Essas soluções, mesmo quando desenvolvidas pelos próprios centros de pesquisa do parque, servem como colaboração e inspiração para novos empreendimentos. “Desenvolvemos esses centros e esperamos que mais startups venham e se aprimorem com os espaços de pesquisa”, afirma Colombo.
O desenvolvimento de soluções sustentáveis também é incentivado por meio de programas de aceleração, como o Programa Sanepar Startups, que busca serviços que contribuam para o setor de saneamento ambiental. Uma das selecionadas na primeira edição foi a O2Eco Tecnologia Ambiental, premiada pela Global Tech Innovator 2025. A startup oferece solução de despoluição da água por meio da bioestimulação natural.
Apoio regional e nacional
Hoje, a maior parte do ecossistema que compõe o Itaipu Parquetec não é residente do espaço físico. Para que, ainda assim, a integração aconteça, são realizadas reuniões online periódicas, festivais anuais que reúnem o ecossistema e compartilhamento de oportunidades às startups. Também é oferecido um “clube de benefícios”, que disponibiliza serviços de nuvem, jurídico e contabilidade.
“Os processos iniciais de operação são difíceis. Essa infraestrutura ajuda a acelerar o negócio e deixar o empreendedor focado na solução”, explica Wilmar Ribeiro Júnior, coordenador da incubadora Santos Dumont, que faz parte do parque. Segundo ele, hoje o ecossistema possui startups de todo o Brasil, são 74 – 33 delas graduadas, que são as que já passaram pelos diferentes estágios de crescimento e “efetivamente vão sobreviver no mercado”.
Startups:
Conheça duas startups do Paraná que fazem parte do ecossistema:
Mahuan Abdala e Cleber Medeiros tiveram a ideia de criar a Stac durante as aulas de empreendedorismo no curso de Ciência da Computação dentro da Itaipu Parquetec. A solução oferece sistemas de monitoramento de aviários que permitem acompanhar indicadores como temperatura, umidade, CO₂, peso das aves e consumo de água e ração, facilitando ajustes rápidos e reduzindo custos operacionais. Os equipamentos funcionam de forma autônoma e sem necessidade de internet local.
“Nossa solução, que antes era uma ideia no papel, ganhou forma após nos inscrevermos para a incubação de empresas do parque, o que nos permitiu estruturar a ideia, validar o produto e desenvolver as primeiras versões”, revela Abdala.
A atuação da startup hoje chega a oito estados brasileiros, com o objetivo de atuar em novos polos de produção. “A proximidade com o ecossistema de inovação nos permite acelerar a evolução tecnológica, manter-se na vanguarda do setor avícola e construir um futuro baseado em inteligência de dados, automação e sustentabilidade”, acrescenta.
A Sismetro nasceu da própria experiência de Alex França, que trabalhava na engenharia clínica de um grupo hospitalar e percebeu a dificuldade de gerenciar manutenção, calibração e rastreabilidade de ativos de forma integrada. Em 2018, ao lado de Márcio Klitzke, foi desenvolvido um MVP para integrar a gestão da manutenção, a gestão de ativos e o monitoramento inteligente de telemetria. A empresa vem da cidade de Marechal Cândido Rondon (PR), onde é residente em um polo do parque no município.
“A plataforma permite controlar manutenções, calibrações, estoques e abastecimentos, oferecendo visão total dos ativos e rastreabilidade completa das operações”, explica França. A mesma solução pode ser usada em usinas, portos, mineradoras, aeroportos e empresas do agronegócio.
A startup passou a integrar o Itaipu Parquetec em 2023. “Desde a entrada no parque, a Sismetro triplicou sua carteira de clientes, profissionalizou a gestão da empresa e recebeu investimento da Bossa Invest”, revela o empreendedor. Após a integração, a startup foi incluída no acordo de gestão do Centro de Empreendedorismo e Inovação do Município, certificando sua atuação regional.
Com o maior alcance de clientes e o reconhecimento regional, a startup espera duplicar o faturamento em 2024.
Futuro e expansão
No planejamento de 2026, Colombo revela que pretende aumentar o número de startups residentes, além de fomentar bolsas para startups, por meio de captações diretas com a Finep, venture capital ou investimento anjo, ou de fontes indiretas, como créditos fiscais ou investimentos obrigatórios pela Aneel ou ANP.
“Faremos também trilhas de empreendedorismo nas universidades para estimular os alunos. Nem todos vão seguir esse caminho, mas aqueles que se interessarem poderão pensar em sua solução tecnológica e abrir suas startups”, revela.

Há ainda a intenção de criar integração com a Argentina e o Paraguai, países que fazem fronteira com a cidade de Foz do Iguaçu, com intercâmbio entre universidades e startups. “Já temos relações internacionais, mas é importante fortalecer a relação com os vizinhos para criar harmonia e ter diferentes olhares sobre o desenvolvimento tecnológico regional”, aponta Colombo.
* A jornalista viajou a convite da Anprotec







