Apesar do esforço para aumentar o número de mulheres nos quadros de funcionárias e em cargos de liderança, o franchising tem visto uma redução na quantidade de empreendedoras que se aventuram no setor. Na percepção de Cristina Franco, presidente do conselho da Associação Brasileira de Franchising (ABF), há avanços, mas a equidade segue distante. “As mulheres empreendedoras foram as mais impactadas com o atual cenário socioeconômico global, marcado pela escassez de recursos naturais e financeiros. Após a pandemia, se tornou mais complexo empreender, tocar o negócio, sobretudo com o crédito mais caro”, diz.
Dados de uma nova pesquisa amostral feita pela ABF jogam luz na questão. O estudo — feito a partir das respostas de 395 marcas, que correspondem a 45% do faturamento do setor e 32% das unidades em funcionamento — mostra que apenas 7% das empresas têm mulheres como proprietárias ou que possuem vínculo familiar com os sócios-proprietários. No último levantamento, em 2015, eram 22%. À frente de unidades franqueadas também houve recuo: de 50% para 32,2% entre 2015 e 2024.
Por outro lado, a presença feminina nos quadros de funcionários das redes passou de 11% para 57%. Em cargos de liderança (C-level, gerenciais, supervisores e membros do conselho), o número subiu de 19% para 29% no período. Nas unidades franqueadas, atualmente 51% (+3%) das funcionárias são mulheres. A ABF ressalta que os dados não são extrapolados para o setor.
De fato, o franchising tem quebrado algumas hegemonias nos últimos anos. Magali Leite, por exemplo, assumiu a cadeira de CEO da Espaçolaser em março. Ela é a primeira mulher à frente da rede de depilação a laser, fundada em 2004 por três homens. Outro caso é o da executiva Juliana Pitelli, que entrou na rede de limpeza residencial e comercial Maria Brasileira como vendedora, há mais de dez anos, e se tornou sócia em 2021, ao lado dos dois fundadores, também homens. Na Bibi Calçados, em 2019, Andrea Kohlrausch assumiu a cadeira de presidente, ocupada durante 30 anos pelo pai.

Menos apetite a risco, mais dificuldade para obter crédito
Para Franco — que foi única mulher presidente na história da ABF (de 2013 a 2016) —, além das questões econômicas, uma explicação para a queda no empreendedorismo pode ser o fato de que as mulheres tendem a apresentar um perfil mais conservador como donas de negócios, o que acaba postergando a opção pelo crescimento com franquias. “Elas têm um apetite menor para risco e costumam ser mais assertivas na expansão do negócio. Eu vejo que muitos empreendimentos prontos não migram para o franchising, pois a mulher está segura no patamar em que está”, diz.
Franquias:
Outro impeditivo é a dificuldade de acesso a crédito. “Com o dinheiro mais caro, elas precisam recorrer às economias de uma vida, e são muito mais cuidadosas, têm menos margem para erros”, afirma. Um levantamento do Sebrae, com base em dados do Banco Central, mostra que as empreendedoras responderam por 40% das 23,1 milhões de operações de crédito realizadas no primeiro trimestre de 2024, mas só acessaram 29,4% dos R$ 109 bilhões de empréstimos destinados ao segmento.
Amanda Tonon, fundadora da rede Kekala, de picolés recheados na hora, por exemplo, conta que recorreu a empréstimos familiares, em 2019, quando bancos e financeiras não acreditaram no potencial do seu negócio.
A paranaense Amanda Rufino precisou recorrer a um empréstimo da própria franqueadora para conseguir abrir uma unidade da Vaapty, rede de intermediação de venda de veículo. Em 2022, ela tinha R$ 80 mil, pouco mais da metade dos R$ 150 mil necessários. Mãe solo de duas crianças, não conseguiu crédito no banco. “Disseram que eu não tinha nenhuma bem para vincular como meio de crédito, que eu precisaria alienar algum carro ou imóvel como garantia. Além disso, falaram sobre o risco de crédito. Eu expliquei que seria para abrir minha empresa, mas eles disseram que não era possível”, conta.
“Muitas vezes, as mulheres precisam trabalhar mais para provar sua competência e conquistar o mesmo nível de respeito e oportunidades que os homens. Isso pode se manifestar na forma como suas decisões são avaliadas, na dificuldade de acessar redes de contato e no acesso a financiamentos”, opina Brunna Farizel, dona da Splash Bebidas Urbanas, ao lado do marido, Lucas Moreira. Ela diz que usa a própria história como chamariz para novas franqueadas.
A pernambucana Patrícia Lima, 43 anos, fundadora da rede Norah Acessórios, conta que precisou lidar com “olhares duvidosos” sobre seu trabalho quando resolveu levar sua marca para shopping centers e se deparou com “mesas cheias de homens”. Um dos principais desafios foi acompanhar a expansão da rede para São Paulo. “Como mãe de duas meninas, ficar longe delas por 20 dias foi muito difícil, mas era necessário para o meu negócio naquele momento”, diz.
Aumentam ações de diversidade nas redes
O estudo da ABF indica que aumentou a conscientização das redes sobre a necessidade de equilíbrio da diversidade de gênero na liderança. 63% das empresas afirmaram contemplar o indicador no seu plano estratégico. Em 2015, eram 29%. Pouco mais da metade – 50,1% – dizem monitorar a diversidade de gênero em cargos altos, contra 7,2% em 2015.
Entre as ações implementadas para fomentar a liderança feminina, as marcas respondentes disseram adotar flexibilidade de horário (56%), treinamento para habilidades específicas (54%), possibilidade de home office (46%), diferentes formas de contratação (31%) e redução de viagens (13%).







