Maria Zontes encontrou em suas criações artísticas uma maneira singular de transformar livros em verdadeiras obras de arte. Paraense de Belém e autodidata de apenas 22 anos, ela começou a desenhar e a pintar aos 3 e, aos 14, a confeccionar cadernos artesanais, que vendia para colegas de escola.
Bastou uma encomenda pontual e seu olhar se voltou para os livros. O que parecia ser um hobby que, por anos, ela mesma desvalorizava, tornou-se item-desejo entre apaixonados por leitura. Quem consegue lugar na sua agenda com uma lista de espera de respeito, tem de desembolsar, no mínimo, R$ 3 mil.
“Não foi fácil chegar até aqui. Durante muito tempo, eu não acreditava no valor do meu trabalho. Cobrei muito barato no início porque achava que o que eu fazia não era bom o suficiente”, recorda. E admite: “Demorou para eu aceitar que meu trabalho tem valor e pode ser bem pago. Sofri por anos com a síndrome do impostor, achando que minha arte era medíocre”.
Foi só aos 19 anos, que a jovem artista decidiu divulgar suas criações no TikTok. A plataforma impulsionou sua carreira. Só nesta rede ela é seguida por 1,7 milhão de pessoas.
No ano passado, ao compartilhar o processo de customização da capa do livro “Amanhecer”, da série Crepúsculo (Editora Intrínseca), ganhou 1 mil novos interessados em adquirir seu trabalho em apenas um dia. Agora, sua lista de espera agrega 11 mil nomes, atendidos quando abre sua agenda para novas encadernações únicas.
A primeira customização que fez, entretanto, foi com o livro “Vermelho, Branco e Sangue Azul” (Editora Seguinte), quando ainda se dedicava apenas aos cadernos artesanais. Hoje, os manuscritos são sua principal atividade.
Zontes não lê todos os exemplares que recebe para fazer as transformações personalizadas, mas explica que pesquisa bastante sobre o enredo antes de elaborar as artes e, se necessário, tira dúvidas com os clientes.
Hoje, suas “encadernações à tela”, método que “une a arte de encadernação com técnicas de artes plásticas”, envolvem um processo que pode durar de dois a quatro meses. O tempo dedicado, mais os materiais utilizados, os procedimentos empregados e a (alta) demanda são levados em conta para o orçamento, que começa na casa dos três milhares de reais. Devido à complexidade e a demora das etapas, a artista costuma trabalhar em até quatro livros ao mesmo tempo.
“Alguns projetos são mais demorados. O mais longo até agora está sendo a saga completa de Harry Potter, na qual já estou trabalhando há mais de seis meses”, revela.
O poder das redes sociais
É justamente a customização de um dos livros da autora J. K. Rowling que Zontes classifica como um dos seus trabalhos mais inusitados, pois incluiu um cenário dentro do exemplar. Nele, a artista buscou reproduzir o quarto em que o bruxinho vivia na casa dos tios “trouxas”. Só no TikTok, são mais 5,2 milhões de views desta criação.
Apesar dos números na casa dos milhões na rede dos vídeos curtos, é o Instagram que converte mais negócios para a artista de Belém. Ali, são 408 mil seguidores – ela possui também 125 mil no YouTube.
“Acredito que, hoje em dia, é quase impossível ser autônomo sem utilizar as redes sociais para divulgação. Meu trabalho cresceu e evoluiu muito graças a essas plataformas”, afirma. Mesmo assim, ela revela não dedicar tanto tempo à criação de conteúdo. “Gravo os processos enquanto trabalho nas encomendas. Depois, o que mais toma tempo é a edição dos vídeos”, diz.
Seu público consumidor é formado, basicamente, por adultos com mais de 30 anos, amantes de livros e colecionadores que buscam peças exclusivas para suas bibliotecas e coleções.
No dia a dia, Zontes conta com o apoio do namorado, que cuida da parte administrativa do negócio. Ele é responsável por entrar em contato com os clientes, acertar detalhes de encomendas e gerenciar a logística. Essa parceria permite que ela se concentre totalmente no processo criativo.
Além das encadernações, oferece oficinas e aulas particulares de encadernação artesanal e ministra cursos online sobre as técnicas e sobre quem quer empreender na área, como ela. A artista tem aproveitado seu engajamento nas redes sociais e trabalhado com marcas que admira, sendo contratada para projetos publicitários.
Vez ou outra, sua expressão artística envolve projetos especiais, como quando customizou um exemplar do livro escrito pela sogra, um presente de aniversário para o cunhado.
Esse tipo de trabalho personalizado, que une emoções e memórias a um objeto físico, reflete a essência do que Zontes busca oferecer com sua arte: que o livro não seja apenas um item decorativo, mas um obra que carregue histórias, tanto nas páginas quanto em sua capa.