Portal BEI

Governo tem 32 políticas de apoio a novos negócios, mas fala pouco com setor

Fonte: Redação

Um dos temas de maior destaque nestas eleições municipais, o empreendedorismo é contemplado pela União em pelo menos 32 políticas públicas ou iniciativas específicas. Mas, nos bastidores do governo federal, autoridades reconhecem a dificuldade em se comunicar com a parcela do eleitorado mais sensível a essa bandeira, uma vez que o foco tem sido abordar principalmente medidas voltadas à agenda macroeconômica.

O levantamento foi realizado pelo Valor com base em informações divulgadas pela Presidência da República, ministérios e bancos públicos. Foram consideradas políticas públicas sem data para acabar e voltadas exclusivamente para empreendedores ou micro, pequenas e médias empresas (MPMEs). A lista é ampla e inclui regimes tributários específicos, linhas de crédito e ferramentas virtuais. E ela passa por vários ministérios, embora hoje tenha como ponto focal o Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Memp). É o que mostra esta reportagem, parte de uma série iniciada pelo Valor no dia 24 de setembro.

Até setembro do ano passado, essa estrutura funcionava como uma secretaria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic). Em meio a uma reforma ministerial para ampliar a base do governo federal no Congresso, ela acabou transformada em uma pasta e desde então é comandado por Márcio França – antes ele era titular do Ministério de Portos e Aeroportos, hoje ocupado por Silvio Costa Filho (Republicanos).

“Nós não estamos mal [sobre as políticas públicas para o setor]”, Bruno Quick.

Ou seja, mesmo com a criação no ano passado da pasta, a grande maioria das iniciativas, incluindo as mais importantes, já estava em vigor antes do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Na mensagem presidencial enviada para o Congresso Nacional no início deste ano, as políticas do Memp ocupavam 3 das 330 páginas. O governo federal afirmava, por exemplo, que estava “empenhado em impulsionar o desenvolvimento econômico por meio de políticas públicas abrangentes e estratégias voltadas aos empreendedores brasileiros”. Um dos destaques mencionados era a Política Nacional de Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas (MPEs), que tem o objetivo de “alinhar e assessorar os programas e projetos conduzidos por várias entidades e órgãos governamentais” a fim de “promover a liberdade de empreender, aumentar a produtividade, a competitividade e o desenvolvimento sustentável”. A proposta foi criada por lei em 2006 e instituída formalmente por meio de decreto em abril deste ano.

A mensagem presidencial estabeleceu três prioridades para 2024, sendo uma delas a própria “efetiva implementação” da Política Nacional das MPEs. As outras eram a criação de uma “estratégia” que facilite a transição do microempreendedor individual (MEI) para a microempresa (ME); e medidas voltadas para o artesanato, como “ampliação dos canais de comercialização, programa de acesso a crédito, rede de agentes capacitadores e reestruturação” do sistema de informações cadastrais do setor.

Outra política de destaque é o Simples, regime tributário simplificado criado em 2007 para empresas que faturam até R$ 4,8 milhões por ano. Mas, conforme publicado pelo Valor em setembro, o regime entrou na mira das revisão de gastos que o governo federal pretende realizar em 2025. A avaliação é que o Simples muitas vezes inibe o crescimento de empresas e, consequentemente, prejudica o crescimento da produtividade da economia como um todo. De acordo com a Receita Federal, a categoria de “outras” desonerações, nas quais entra o Simples, levou o governo federal a renunciar a R$ 76,2 bilhões entre janeiro e agosto deste ano.

O crédito bancário também é uma das principais vertentes. Um exemplo é o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), voltado para garantias bancárias. O programa, que resulta em condições mais vantajosas de carência por exemplo, foi criado de maneira a princípio temporária durante a pandemia, mas acabou se tornando permanente. Também entram na conta linhas como o Crediamigo, programa de microcrédito orientado oferecido pelo Banco do Nordeste (BNB), ou o GiroCaixa Fácil, que oferece empréstimos de até R$ 10 mil.

No domingo, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou que oferecerá R$ 100 bilhões em crédito para MEIs e MPMEs por meio do Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (PEAC), também criado na pandemia e que facilita a concessão de garantias. De acordo com o BNDES, a estimativa é que o montante resulte em mais de 200 mil operações nos próximos 12 meses, sem impactos fiscais para a União.

Com o aumento do acesso ao crédito, um ponto de atenção do Executivo tem sido a inadimplência desse segmento.

Números do Banco Central (BC) levantados pelo Valor mostram, no entanto, que a distância entre a inadimplência das MPMEs e das grandes empresas vem aumentando – ainda que historicamente o indicador seja maior para o primeiro grupo do que para o segundo. Em agosto, a inadimplência das MPMEs estava em 4,48%, enquanto no caso das grandes empresas o indicador era de apenas 0,22%. Para atacar esse problema, o governo lançou o programa Acredita – conjunto de propostas voltado, entre outros, para MEIs e MPMEs.

Em outra frente, nos bastidores do governo federal se avalia que a equipe econômica vem conseguindo melhorar o ambiente de negócios, beneficiando empresas de menor porte ou quem pretender abrir o próprio negócio. Mas ainda não conseguiu neutralizar todas as críticas de adversários de partidos de direita, ainda que a figura jurídica do MEI tenha sido criada no segundo mandato de Lula, em 2008. O MEI é uma das principais políticas em vigor para o segmento, ao trazer uma série de benefícios, como tributação reduzida e acesso a linhas de créditos específicas, para pessoas físicas que ganhem até R$ 81 mil anuais.

“O governo federal tem buscado ampliar o crédito em geral, e empreendedores e MPMEs são alguns desses focos”, diz Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi). Ele cita medidas como o Pronampe, mas também o ProCred 360, linha que oferece taxas de juros menores do que as normalmente praticadas e condições de prazos mais vantajosas, e o Desenrola Pequenos Negócios, programa de renegociação de dívidas bancárias e que permite que as empresas voltem a contratar empréstimos.

Algumas delas, no entanto, foram implantadas por meio de medida provisória (MP) que perdeu a validade em agosto. O projeto de lei que restabelece essas medidas foi aprovado pelo Congresso neste mês, mas ainda aguarda sanção presidencial, o que significa que elas não estão em vigor até lá. Números mais recentes do BC levantados pelo Valor mostram que o crescimento acumulado em 12 meses do estoque do crédito bancário foi semelhante para pessoas jurídicas como um todo (alta de 5,8%) e para MPMEs (5,7%).

Há ainda iniciativas mais específicas, como: BNDES Garagem, que oferece consultoria a “startups em estágio inicial ou de crescimento”, e Área de Recomendações Inteligentes (ARI) do Banco do Brasil (BB), ferramenta de inteligência artificial que auxilia as empresas menores em questões como fluxo de caixa e análises financeiras.

Diretor técnico do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Bruno Quick, dá nota 7 para o conjunto de políticas públicas federais. “Não estamos mal”, diz, embora defenda uma série de aprimoramentos. Entres eles, estão a criação de um programa “vigoroso” de qualificação profissional nas áreas de tecnologia da informação e comunicações (TIC) e inteligência artificial e a expansão do programa Brasil Mais Produtivo, criado pelo Mdic, “para além da indústria”.

Economista da Tendências Consultoria, Thiago Xavier destaca a importância de as políticas públicas considerarem “os determinantes que levaram as pessoas a entrarem no empreendedorismo”, uma frente em que o Brasil ainda tem um espaço “grande” para avançar. Um dos principais debate envolve se a entrada no empreendedorismo foi por necessidade ou escolha.

“Os perfis, as habilidades, os históricos profissionais e os desejos são muito diferentes”, afirma ele, mestre em economia pelo Insper, com tese a respeito dos impactos do Auxílio Emergencial sobre a oferta de trabalho dos entregadores por aplicativo durante a pandemia.

A partir desse diagnóstico, seria possível desenhar programas mais adequados. No caso do Brasil, a “política de cobertura social do trabalho”, por exemplo, formada por seguro-desemprego, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e abono salarial, “ainda é muito ligada à visão de emprego formal”. (Colaborou Fernando Exman)

Em parceria com: Pequenas Empresas & Grandes Negócios

Compartilhe:

WhatsApp
Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest
Telegram
+ Relacionadas
Últimas

Newsletter

Fique por dentro das últimas notícias do mundo dos negócios!