O bolsista Yan Kaled, 29, já estava desenvolvendo a ideia para a HiSolver em Harvard quando decidiu propor uma reunião com Jorge Paulo Lemann para mostrar como o dinheiro da sua fundação estava sendo usado. Quando foi apresentado ao projeto da startup, uma plataforma que permite a criação e monetização de IAs para compartilhamento de conhecimento, o empresário viu potencial no negócio. Uma semana depois, Felipe Muniz, 30, o outro cofundador, pediu demissão de seu emprego para focar 100% na startup.
A dupla se conheceu na Universidade de São Paulo. Enquanto cursava o primeiro ano de matemática aplicada e computacional, Kaled conquistou uma bolsa integral para a Universidade da Califórnia, mas não tinha os recursos para se manter nos Estados Unidos e precisou negar a oportunidade. “Mesmo para um aluno dedicado, faltam recursos informacionais para entender que existem formas de alcançar oportunidades internacionais e se posicionar no mercado. A HiSolver surgiu para resolver esse problema”, relembra.
O sistema da edtech surgiu em 2020, antes do boom da inteligência artificial generativa. Seus professores na USP recomendaram que Kaled desenvolvesse a ideia do negócio em um mestrado em alguma universidade top de linha internacional. Ele passou em Harvard e Stanford e conquistou três bolsas, incluindo a da Fundação Lemann.
Paralelamente, Muniz continuou no Brasil, construindo a carreira no mercado financeiro, com passagens por Itaú BBA e XP Investimentos, onde trabalhava quando a dupla decidiu apostar firme na ideia da HiSolver, em 2024.
Startups:
Os sócios definem a plataforma como um marketplace social — a HiSolver pode ser descrita como um híbrido da Hotmart com o LinkedIn, potencializado pelo uso da IA. Pessoas podem criar produtos, como comunidades, cursos e agentes, para compartilhar conhecimento. “Outras soluções de IA normalmente isolam o aluno na relação com a máquina. A nossa ferramenta otimiza a aprendizagem com tutores 24 horas por dia, mas em um ambiente que pode ser um grupo, com insights de toda a comunidade”, pontua Muniz.

Os usuários podem acessar a plataforma e conhecer todas as IAs criadas por outras pessoas, filtrar assuntos do seu interesse e acessar comunidades para troca de conhecimento. Outras abas incluem um chat, com interface similar ao WhatsApp, e um feed, onde é possível compartilhar ideias e embutir uma IA para trazer mais informações.
A HiSolver oferece uma versão gratuita limitada a cinco interações de IA por hora. A versão premium, que custa US$ 5 (R$ 29,4) mensais, permite interações ilimitadas. Além disso, a plataforma cobra uma taxa de 7% sobre as vendas realizadas dentro do seu ecossistema.
“Pensamos a HiSolver como uma forma nova de aprender, compartilhar e monetizar conhecimento. Você vende a sua experiência treinando uma IA e cobrando das pessoas que utilizam essa ferramenta”, afirma Muniz. Ele, por exemplo, treinou um agente sobre gestão de riscos com o conhecimento que adquiriu após anos no mercado financeiro.
Dos 10 mil usuários que a HiSolver já conquistou, 40% estão no Brasil e outros 20% nos Estados Unidos. Segundo os fundadores, nos últimos 90 dias a startup atraiu interessados de outros países, como Afeganistão e Alemanha, apenas otimizando o conteúdo para os motores de busca, sem investimentos financeiros. Nos próximos cinco anos, a estimativa é chegar a 2 milhões de usuários, com faturamento anual de US$ 50 milhões (R$ 294 milhões).

Além da atuação no B2C, a startup trabalha com instituições de ensino para oferecer um ambiente privado e assinaturas para os alunos. A primeira parceria se deu justamente com a Harvard, para um projeto de pesquisa da escola de odontologia (Harvard School of Dental Medicine), mas a Link School of Business, de São Paulo, também é cliente da HiSolver. “Estamos tentando com o setor público, é uma das nossas missões. Tivemos nossas condições socioeconômicas mudadas pela educação. O nosso sonho é ver os alunos das escolas públicas tendo acesso a essas ferramentas”, almeja Muniz.
O projeto com a Harvard surgiu após a professora brasileira Shelyn Yamakami perguntar em um grupo se alguém conhecia uma plataforma educacional que usasse IA. “É um movimento que vimos nas grandes universidades, sabem que a IA chegou para ficar e é o momento de entender como usamos a tecnologia da melhor forma nas instituições. A própria universidade começou a financiar pesquisas robustas para testar novos usos dentro do contexto educacional”, explica Kaled.
A HiSolver foi avaliada pelo corpo docente e os testes terão início neste mês. A ideia é separar os estudantes em dois grupos para avaliar a performance após o uso da plataforma. A pesquisa terá duração de cerca de um ano. “Essa parceria é especial porque vai resultar em artigos acadêmicos sobre o uso da IA no aprendizado e propor diretrizes para outras instituições. Eu acredito que o que vamos gerar de inovação poderá ser usado em outros contextos, como o uso por empresas”, acrescenta Kaled.
A startup captou US$ 100 mil (R$ 588 mil) em uma rodada anjo, liderada pela Plug and Play Ventures, em 2024. Em sete meses, o capital foi usado para contratar o time e lançar o produto mínimo viável (MVP). Agora, abriu uma nova rodada com o objetivo de levantar US$ 2 milhões (R$ 11,7 milhões) para dobrar o time, entregar as soluções previstas no roadmap e investir em comunicação. As conversas tiveram início em março e os fundadores estão dando preferência para grandes empresários e grupos do ramo educacional.
“Sabemos o valor dos fundos de venture capital, mas estamos a fim de sócios que conheçam profundamente o setor. O capital intelectual e sócios engajados são mais importantes”, ressalta Muniz, que estima concluir a captação nos próximos três meses.