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Alta histórica no preço do café impacta empreendedores que dependem do insumo; veja como se adaptar

Fonte: Redação

Depois de um aumento de quase 40% no preço do café moído em 2024, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a bebida mais consumida do país continua pesando no bolso dos brasileiros. Para empreendedores que dependem do insumo, a alta já está impactando os negócios, que têm encontrado diferentes formas de gerir o aumento de custos.

Na última segunda-feira (3/2), a saca de 60 quilos do café arábica, um dos mais consumidos no Brasil, chegou a R$ 2.565,86. O valor é o maior da série histórica iniciada em setembro de 1996 pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), campus da USP em Piracicaba (SP), considerando valores deflacionados pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna), utilizado para medir a inflação de forma ampla.

Na Padaria Europão, na capital paulista, os gastos com café cresceram mais de 20% no último ano, mesmo com negociações diretas com o produtor. Para lidar com o preço elevado, parte do aumento vem sendo repassado para os consumidores a fim de manter o padrão dos produtos e a sustentabilidade do negócio. “Ainda assim, como o aumento do preço tem sido exponencial, não é possível repassar integralmente, e isso está impactando a nossa margem de lucro”, diz Carla Braga Dias, administradora e sócia do negócio.

A empreendedora afirma que, antes de aderir ao aumento de preços no cardápio, outras medidas foram implementadas. Entre elas, Dias destaca a busca por melhores condições de compra do insumo, a partir de negociações de desconto por volume de compra, e a otimização de processos para evitar desperdícios, como o calibramento das máquinas de café.

De acordo com Geraldo José Melaré, consultor de negócios do Sebrae-SP, este é um dos caminhos mais aconselhados para os empreendedores. Para ele, é importante que as empresas considerem algumas alternativas antes de repassar o aumento para a clientela, como melhorias de processos, de produtividade e oxigenação de equipes. O especialista afirma que o aumento de preço deve ser uma das últimas alternativas, já que a mudança pode gerar um panorama de menor consumo.

O temor da evasão de clientes foi o que levou a rede de franquias Café du Centre, que conta com lojas em oito estados brasileiros, a ter cautela ao pensar em estratégias para lidar com o aumento dos custos. “Diminuímos a margem de lucro e ganhamos na quantidade”, diz Bruna Vieira, sócia-fundadora do negócio. Assim, a empreendedora afirma que não apenas não enfrentou nenhuma queda de consumo, como aumentou as vendas. “Na minha loja matriz, estou comprando o dobro de café em comparação com o ano passado”, aponta.

Para os negócios que não conseguirem fugir do repasse dos gastos para os consumidores, Melaré, do Sebrae, indica uma precificação estratégica, com a transparência e agregando valor à experiência do cliente.

Mariana Jolt, cofundadora da Caneca Bistrô & Brunch, cafeteira localizada em São Bernardo do Campo (SP), diz que olhar para o consumo enquanto uma experiência e comunicar essa ideia para os clientes tem sido uma das alternativas. Ela afirma que as redes sociais têm sido aliadas para ressaltar para os consumidores os diferenciais do negócio e manter a atratividade do estabelecimento. Além de compartilhar os bastidores da cafeteria, os empreendedores usam as redes para divulgar alguns dos destaques do cardápio.

“Para minimizar os impactos, revisamos toda nossa estrutura de despesas e realizamos ajustes estratégicos, buscando otimizar processos e reduzir desperdícios sem comprometer a qualidade do nosso produto. No entanto, mesmo com esses cortes internos, foi inevitável repassar uma parte desse aumento para os preços do cardápio”, diz Jolt.

Dicas para gerir o aumento de custos

O consultor de negócios do Sebrae ressalta algumas sugestões para quem tem o café como um dos principais produtos do negócio:

  • Estoque estratégico e compra antecipada: se houver sinais de alta nos preços, adquirir matéria-prima antecipadamente pode ajudar a garantir um custo menor;
  • Armazenamento adequado: tendo em vista que o café tem prazo de validade, é essencial estocá-lo corretamente para evitar perdas e desperdícios;
  • Relação com fornecedores: com a diversificação das fontes de compra, o empreendedor ganha espaço para negociar preços e prazos. Além disso, é possível buscar produtores locais ou cooperativas que possam oferecer valores mais acessíveis e estáveis;
  • Ajuste do cardápio: mexer no cardápio sem ajustar o preço é possível a partir da criação de novas bebidas que misturem café com outros ingredientes mais baratos, como especiarias ou leitas, o que pode agregar valor sem elevar tanto os custos;
  • Promoções inteligentes: ao invés de oferecer descontos diretos, é possível ofertar combos ou programas de fidelidade para manter a clientela;
  • Uso de tecnologia: softwares de gestão ajudam a controlar melhor os estoques e evitar desperdícios. A tecnologia também pode apoiar no monitoramento de tendências de preço para ajudar a planejar compras no momento certo.

O que explica a alta no preço do café e de outros alimentos

O aumento no preço do café é resultado de um conjunto de fatores, que incluem impactos do clima na produção do grão, o ritmo de exportação e a desvalorização do real frente ao dólar. Aniela Fagundes Carrara, economista, professora da UFSCar e integrante da equipe de Macroeconomia do Cepea Esalq/USP, afirma que, somados, diferentes motivos levaram a uma redução do estoque dos grãos. “Quando a oferta é menor, a tendência é o preço subir”, diz.

De acordo com Cristiano Corrêa, professor de Finanças do Ibmec, as safras de café de 2023 e 2024 enfrentaram dificuldades com o clima, com maiores períodos de estiagem nas plantações. O problema, não afetou apenas o Brasil. Segundo Carrara, o Vietnã, por exemplo, um dos maiores produtores de café do mundo, também enfrentou uma crise, o que levou a uma redução global na oferta do café.

Com diversos países buscando alternativas para conseguir os grãos, as exportações brasileiras aumentaram. “Considerando a relação da nossa moeda para com o dólar, foi vantajoso para os produtores brasileiros exportarem e para os compradores externos comprarem do Brasil, o que também contribuiu para reduzir nossa oferta interna de café”, aponta Carrara.

Segundo dados divulgados pelo Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil), com o compilado das exportações até novembro de 2024, o volume de exportação no ano passado bateu o recorde. Em 11 meses, foram exportados 46 milhões de sacas de café, um aumento de 3,78% em relação ao maior volume registrado até então, de 44,707 milhões de sacas, atingidos nos 12 meses de 2020.

Além disso, Corrêa afirma que o aumento das taxas de juros no Brasil encareceu a produção para os fabricantes que dependem de financiamentos para manter a operação.

Os especialistas destacam que o café não foi o único produto a enfrentar um aumento. Em janeiro, o IPCA-15, considerado a prévia da inflação, mostrou um avanço de 1,06% do preço do grupo de alimentos e bebidas no mês. Produtos como carne (1,93%), frango (1,99%) e alface (1,15%) seguiram a tendência de alta já apresentada em 2024. Outros insumos, como cebola (4,78%) e tomate (17,12%) tiveram aumento de preço no mês após registros de queda.

Mariana Jolt, do Caneca Bistrô & Brunch, afirma que o negócio está sentindo não apenas do café. “Essa alta generalizada nos custos tem afetado nosso crescimento e gerado desafios financeiros, principalmente porque o mercado não acompanhou essa valorização nos preços, tornando o cenário instável e desafiador para os próximos meses”, diz.

Segundo Carrara, de modo geral, os fatores que impactam no preço dos alimentos são os mesmos do café, com exceção de algumas particularidades de cada cadeia produtiva, que leva a impactos diferentes no preço de cada produto. Na avaliação dos especialistas ouvidos dos PEGN, o cenário de incerteza para os próximos meses deve levar a uma continuidade nas altas, tanto do café, como de outros produtos.

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